O Senhor diz-nos que o Reino de Deus está entre nós. Não somente entre nós, mas até no mais íntimo ao nosso ser : «Aquele que me ama, guardará as minhas palavras, e meu Pai o amará, e viremos a ele e nele faremos a nossa morada» (João 14, 23 ). E pena que esqueçamos tanto estas verdades. Há muitas almas, na Igreja que se esforçam por viver honestamente e procuram aproximar-se de um certo ideal de pureza moral: mas muito poucas sabem conservar-se elevadas na fé, apoiadas na esperança e abrasadas pela caridade, de modo a participar completamente na vida que Jesus lhes quer comunicar.
Nós estamos cercados, envolvidos pelas providências divinas: temos tudo o que é necessário para começar, desde já, uma existência de sublime intimidade com Deus. Tenhamos pois vontade de viver a nossa vida sobrenatural. Conhecemos os princípios, o caminho está aberto; seria pois um erro da nossa parte não nos orientarmos por ele. Temos de concordar que os «filhos do século são mais hábeis nos seus negócios do que os filhos da luz» (Lc 14, 8). Na realidade, recebemos um tesouro infinito que não sabemos apreciar, e a ignorância em que vivemos acerca do seu verdadeiro valor impede-nos de o aproveitar convenientemente.
Pois não era a nossa negligência que o Senhor visava, quando falou do talento estéril que o servo desajeitado lançava e escondia inutilmente na terra? E todavia Cristo não se limita a oferecer-nos o seu amor infinito. Intima-nos com tanta insistência que parece querer obrigar-nos a aceitar. Procede conosco um pouco como em relação àqueles miseráveis – os enfermos de que fala o Evangelho – que não tinham sequer liberdade de recusar o convite divino: «Obriga-os a entrar» ( Lc 14, 23 ). Ouçamos este chamamento, e será nossa a oração da Igreja: «Concede-nos, Senhor, um acréscimo de fé, de esperança e de caridade».
Não nos contentemos com alguns atos de piedade no princípio e no decurso do dia. Tais práticas não formam uma vida, conceito que implica uma atividade permanente e contínua. Ora, o Senhor quer ser a nossa vida: «Eu sou a vida» (Jo 11, 25). É pois preciso estarmos unidos a Deus momento a momento. Jesus não nos pede tal fórmula ou tal gesto de piedade e de devoção; pede-nos todos os nossos instantes, todas as nossas forças, toda a nossa alma, para, em troca, nos fazer começar a viver já no mundo a vida eterna.
Texto de autoria de um monge cartuxo desconhecido, extraído do seu livro “Silêncio e Intimidade com Deus”.
Emanuel de Jesus
Missionário da Comunidade Católica Missão Maria de Nazaré