A palavra “dom” traz em si mesma uma grande riqueza de significado. Se procurarmos nos dicionários encontraremos definições como: “ação de passar a outrem a posse ou o usufruto de algo”; “bem ou graça recebida de divindade”; “aptidão inata para fazer algo”, entre outros. Porém, na Teologia do Corpo do Papa São João Paulo II, a palavra dom parece se assemelhar mais com a seguinte definição: “dádiva, presente dado por alguém”.
Na catequese número 13 o Papa diz que “toda a criatura traz em si o dom original e fundamental”. Podemos então, a partir da ideia de que dom é uma dádiva ou presente, compreender que o corpo e a sexualidade humana são presentes que Deus nos deu para aperfeiçoarmos nossa capacidade de amar, que é o sentido maior de nossas vidas. Nas experiências originais vividas pelo primeiro homem, o corpo parece passar por mudanças que elevam esta nossa capacidade de amar a um nível de semelhança à Deus.
A primeira experiência, por exemplo, a solidão, faz com que o homem se entristeça, pois não foi feito para estar só. Fomos criados para sermos imagem de um Deus que embora seja um não é sozinho. Deste modo, da experiência da solidão progredimos para uma segunda experiência, a da comunhão. Aquilo que era tristeza se torna alegria e júbilo. Mas não para por aí, pois não basta nos unirmos em uma relação de amor e complementariedade, é necessário que este amor tenha como princípio a pureza de coração, expressa pela nudez original: “…estavam nus, e não se envergonhavam” (Gn 2, 25). Deste modo, o corpo e a sexualidade humana alcançam o nível do “dom de si”, ou seja, do presente que Deus nos dá um para o outro e de sermos capazes, semelhantes a Ele, de amarmos verdadeiramente.
São João Paulo II afirma que “… sozinho o homem não realiza totalmente a sua essência. Ele só a realiza existindo ‘com alguém’, e ainda mais profunda e completamente, existindo ‘para alguém’. Atravessando a profundidade da solidão original, o homem surge agora na dimensão do dom recíproco, que por isso mesmo é expressão da sua existência como pessoa, é o corpo humano com toda a sua verdade original da sua masculinidade e feminilidade” (TdC 14). É neste sentido também que o Santo Papa afirma que esta complementariedade entre os sexos não se limita a capacidade de fecundidade e procriação, também próprio nos outros animais, mas vai além desta ordem natural. O corpo humano é, portanto, capaz de expressar amor, isso é seu atributo “esponsal”.
Este amor esponsal é exatamente aquele em que a pessoa humana se torna um dom, e por meio deste dom, realiza o próprio sentido do seu ser e existir. Quando o homem acolhe a mulher como um dom em si mesma, ele está considerando-a como única e irrepetível, escolhida pelo próprio amor, e do mesmo modo ela o acolhe como um presente de Deus “querido por si mesmo”. São João Paulo II diz que “nisto consiste a revelação e a descoberta do significado esponsal do corpo” (TdC 15), que mesmo sofrendo com as deturpações providas do pecado original, ainda poderemos por meio da simplicidade e da pureza de coração manifestar toda a sua verdade, como um sinal autêntico da “imagem de Deus”. Deste modo, podemos afirmar que ainda somos capazes de amar verdadeiramente.