Uma das experiências mais marcantes da minha caminhada foi o Carnaval no Acampamento VEM LOUVAR, da Comunidade Canção Nova, em Cachoeira Paulista. Depois de muito tempo, foi maravilhoso poder assistir ao vivo a pregação do falecido fundador da Comunidade Canção Nova, Monsenhor Jonas Abib. Naquele dia, o que presenciei não foi a imagem de um “velho” jogando palavras ao vento, mas a potência, a força e a disposição que a fidelidade a Deus é capaz de proporcionar aos seus servos que, destemidamente, cometem a loucura de dizer SIM aos desígnios de Deus.
Tanto quanto eu, creio que muitos católicos que têm seu apostolado dentro da Igreja, seja numa pastoral, grupo de oração, nova comunidade, etc.. deparam-se, um dia, com aquela impressão de que já fizeram o suficiente pelo apostolado ou que já são sábios o bastante para já não precisar beber das fontes iniciais de sua conversão. Eu mesmo sou um desses, algumas vezes. Julgo já não precisar ler ou ouvir tanto as pregações daqueles grandes servos que me formaram ao longo da caminhada; julgo já ter amadurecido demais para que as pregações dos grandes rebanhões sejam capazes de me levar à conversão.
Acabamos, assim, correndo o risco de incorrer na lamentação feita à igreja de Éfeso, do livro do Apocalipse: “Mas tenho contra ti que arrefeceste o teu primeiro amor” (Apocalipse 2, 4). Não será raro em nossa que sintamos um certo fastio pela obra que outrora abraçamos apaixonadamente. E isso tantas vezes se dá por conta de nos afastarmos da intimidade com o Senhor. Ora, qualquer um que abandone um certo grau de intimidade com a pessoa que ama, seja um casal de esposos, namorados, até mesmo com um amigo, sente que a relação vai se tornando fria, distante, de modo que o dia a dia daquela pessoa já não é partilhado conosco.
Isto é algo que nós, filhos de Deus, eleitos e chamados por Deus não somente para realizar uma obra nova, mas principalmente para sermos obra nova no mundo, precisamos cuidar para que não nos aconteça. Isso, é VITAL que reinflamemos o carisma que Deus um dia plantou em nosso coração. É vital que permitamos que essa semente verdadeiramente se inflame e consuma tudo o que somos. “Não permitais que morra em vós a semente de vocação plantada por Deus” dizia um cartaz que vi numa igreja, certa vez. Se não for assim, não demorará muito para que a nossa fé adormeça sob os escombros do tempo, e esfrie, inútil até mesmo para sustentar a nossa vida espiritual.
Em sua homilia da Santa Missa, Monsenhor Jonas testemunhava acerca disso. Dizia-nos que todos que ali estávamos éramos fruto do SIM que ele mesmo um dia deu a Deus para seguir a inspiração de um novo apostolado na forma de uma comunidade. Hoje todos sabemos o que é a Comunidade Canção Nova e o quanto essa obra edificou diversos grupos de jovens, ministérios de música, grupos de oração e tantos outros apostolados na Igreja do Brasil. E tudo isso não se realizou de outro modo senão pela radicalidade do SIM de um homem que não impôs limites aos planos do Senhor, mas buscou na pequenez e fidelidade o combustível essencial para ser constante e fiel ao longo de todo o caminho. Viver algo que nós muitas vezes nos propomos, mas tão raramente bem cumprimos: fidelidade nas pequenas coisas.
Lembro-me, ainda hoje, que naquela pregação, Monsenhor Jonas conduziu a uma oração vocacional por meio do hino A Barca. E um verso me chamou a atenção de modo muito particular: “Tu, minhas mãos solicitas / Meu cansaço, que a outros descanse…” . Ao ouvir esse trecho da canção, o Senhor me conduzia a perceber o quão necessário é que nos gastemos e desgastemos em seu serviço. Mais ainda, é impossível servir a Deus de modo verdadeiramente comprometido sem que isso gere em nós um esforço humano, um cansaço, não ruim, mas o cansaço daqueles que sabem que se esforçam pelo que vale a pena.
É a isso que somos chamados! Nosso cansaço, nosso esforço apostólico deve se transfigurar em repouso para aqueles aos quais o Senhor nos envia. Amar verdadeiramente a Deus não é possível se esse amor não se transfigura em amor humano levado às últimas consequências, e consequências de uma radicalidade madura, traduzida na vida, o que faz com que a própria vida que vivemos se transfigure em vida de Cristo.
Em Cristo Jesus