Há uma passagem do Evangelho que costuma provocar polêmica. Trata-se do episódio que está em Mateus 12, 46-50. Ao tomar conhecimento de que sua Mãe e seus irmãos estão do lado de fora querendo falar-lhe, Jesus responde com uma pergunta: “Quem é minha mãe? Quem são meus irmãos?” E apontando com a mão os discípulos, diz: “Eis minha mãe e meus irmãos. Quem cumprir a vontade de meu Pai, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”. A primeira questão polêmica gira em torno da palavra irmão. Seriam estes irmãos, filhos de Maria Santíssima e de São José? A resposta é não. A Tradição sempre viu Nosso Senhor como filho único de Nossa Senhora, que permaneceu virgem antes, durante e depois do parto. A Virgindade Perpétua de Maria é algo crido inclusive nas Igrejas Orientais (ortodoxas e outras) que atribuem estes irmãos a um casamento anterior de São José que, ficando viúvo, teria desposado a Virgem Maria.
Já São Jerônimo, eminente estudioso e tradutor das Sagradas Escrituras, concluiu que a palavra irmão é usada em seu sentido amplo, e quer dizer parente, podendo significar primo e até mesmo tio. A explicação de São Jerônimo é a da Igreja (Católica latina). Os irmãos de Jesus aí citados são seus primos. Comparando-se os quatro evangelhos, pode-se também concluir que, por exemplo, no caso de Tiago, chamado de irmão do Senhor, ele é filho de Cléofas, chamado também de Alfeu e de Maria, chamada Maria de Cléofas. Cléofas seria irmão de São José, ambos filhos de Heli, portanto Tiago é primo de Jesus, e nas listas dos apóstolos de Mateus (10, 2-4), de Marcos (3, 16-19) e de Lucas ( 6, 13-16), Tiago é citado como Tiago de Alfeu, isto é, Tiago, filho de Alfeu e o outro Tiago, como filho de Zebedeu, irmão de João, não aparecendo nenhum Tiago, filho de José e Maria. Interessante que mesmo entre os primeiros protestantes, como Lutero, Calvino e Zwinglio, nunca houve dúvida da virgindade perpétua de Maria e de que estes irmãos são, em verdade, primos de Jesus.
Outro ponto que suscita dúvida é se Jesus com sua resposta estaria desprezando sua família de sangue, sua mãe, aquela do qual ele descende pela carne. A resposta, uma vez mais, é não. Ora, não se trata de desprezo à família, coisa que Nosso Senhor jamais ensinaria, pois se devemos amar até os inimigos, quanto mais a mãe e os irmãos além do que o mandamento de Deus de honrar pai e mãe permanece sempre válido. A questão é outra. Cristo que dar relevo a um novo tipo de família: Aquela que nasce de um parentesco espiritual, uma família ampliada ligada pelos laços cristãos da fé e da caridade e, sobretudo, da fidelidade e obediência a Deus, o Pai no dizer de Cristo. Quanto à mãe, quem mais do que Maria soube ser fiel e obediente à vontade divina? A própria maternidade de Maria Santíssima que, cheia de verdadeira e profunda fé, responde com um generoso sim é prova de sua fidelidade: “Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a vossa palavra” (Lc 1,38).
Busquemos, pois, fazer sempre a vontade do Pai, seguindo o conselho de Cristo, de maneira a sermos membros desta família espiritual da qual Nossa Senhora é o membro mais fiel, modelo de discípula sempre atenta à vontade do Pai. Amém!
Texto do então João Dias Rezende Filho, publicado na Coluna “Palavras que libertam” do Jornal da Paróquia São Francisco de Assis, da Arquidiocese de São Luís do Maranhão – Arquidiocese de São Luís do Maranhão.
Padre João Dias Rezende Filho
Texto publicado em 12 de agosto de 2012, pelo então seminarista João Dias